A circulação recente de notícias sobre uma possível “lei que acaba com o pagamento do auxílio-reclusão” reacendeu um dos debates mais inflamados do Direito Previdenciário brasileiro. Em meio a discussões no Congresso Nacional e manchetes virais, é dever da comunidade jurídica analisar friamente o cenário atual, separando o fato político da realidade constitucional.
Neste artigo, analisamos o status do benefício no final de 2025, os Projetos de Lei (PLs) em tramitação e os entraves constitucionais para a sua extinção.
1. O Cenário Atual: O Benefício Acabou?
Primeiramente, é necessário esclarecer o status quo: Não, o auxílio-reclusão não foi extinto.
Apesar da forte pressão legislativa, o benefício continua vigente, regulado pela Lei nº 8.213/91 e com alterações trazidas pela Reforma da Previdência (EC 103/2019) e MP 871/2019. Em 2025, ele permanece restrito aos dependentes de segurados de baixa renda recolhidos à prisão em regime fechado, com valor limitado ao salário mínimo vigente (R$ 1.518,00).
2. As Duas Frentes Legislativas em Disputa
O que motiva as manchetes atuais é um “cabo de guerra” legislativo que se intensificou no segundo semestre de 2025. Podemos dividir as propostas em duas vertentes principais:
A. A Vertente Extintiva (Marco da Segurança Pública)
Liderada por alas da oposição e parte da bancada da segurança, esta frente propõe a vedação total do benefício para dependentes de presos que integrem organizações criminosas.
- O Objetivo: Desidratar financeiramente o crime organizado e atender ao clamor popular que rejeita o pagamento de benefícios estatais ligados a criminosos.
B. A Vertente Compensatória (A Indenização à Vítima)
Uma proposta tecnicamente mais robusta (derivada de projetos como o PL 6.024/23) sugere a manutenção do benefício, porém com uma alteração funcional: o desconto de um percentual (cerca de 30%) do valor, que seria repassado diretamente à vítima do crime ou seus herdeiros.
- O Objetivo: Introduzir um caráter de reparação civil e justiça restaurativa dentro da lógica previdenciária.
3. A Análise Jurídica: Por que é difícil “acabar” com o benefício?
Para o jurista, a questão vai além da moralidade do crime: ela esbarra na dogmática constitucional. Existem três pilares que tornam a extinção pura e simples do auxílio-reclusão juridicamente frágil e passível de derrubada pelo STF:
- Natureza Contributiva (Seguro, não Assistência): O auxílio-reclusão não é um benefício assistencial (como o Bolsa Família). Ele é previdenciário. O preso pagou por ele enquanto trabalhava. O Estado arrecadou essas contribuições sob a promessa de cobertura de riscos (morte, invalidez, reclusão). Suspender o pagamento seria, em tese, um enriquecimento ilícito do Estado, que recebeu o prêmio do seguro mas se recusa a pagar a indenização.
- Princípio da Intranscendência da Pena (Art. 5º, XLV, CF): A Constituição Federal determina que “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”. O auxílio é pago aos dependentes (filhos menores, cônjuges), não ao preso. Cortar a verba de subsistência de uma criança devido ao crime cometido pelo pai fere este princípio, punindo a família por um ato de terceiro.
- Proteção Integral à Criança e ao Adolescente: Retirar a fonte alimentar de menores de idade, que muitas vezes já vivem em situação de vulnerabilidade social, violaria frontalmente o Art. 227 da Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Conclusão
Embora o debate político sobre o fim do auxílio-reclusão seja legítimo e reflita a insatisfação da sociedade com a segurança pública, o caminho jurídico é estreito.
A tendência para 2026 não é a extinção total — que certamente seria judicializada e considerada inconstitucional —, mas sim uma remodelação do benefício. A proposta de destinar parte do valor para a indenização das vítimas surge como o “caminho do meio”, conciliando o direito previdenciário dos dependentes com a necessária resposta estatal às vítimas da criminalidade.
Como operadores do Direito, devemos acompanhar não apenas as manchetes, mas o texto frio da lei e a jurisprudência das cortes superiores, orientando nossos clientes com base na realidade normativa, e não em especulações.
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Odilon de Oliveira Júnior é advogado (OAB/MS 11.514).

